segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Intemperança


Distraída, podia se dizer dela, brigava consigo mesmo por não conseguir controlar determinada situação por uma simples distração.
E foi assim que ela começou a se distanciar de tudo o que gostava, nem que fosse a mãe a irmã, o amigo.
Trágicas tentativas de aproximação faziam seu ego afundar cada vez mais, pois jurava não obter resposta, por fim, tudo era um caos nos seus relacionamentos. Pior ainda era ser rotulada de “coitada”.
Até era agradável nos primeiros dias, conhecer, descobrir... Mas depois que os dias passavam depois que já não existia novidade. Era como se não conseguisse ultrapassar aquela barreira. Logo lhe faltava paciência para persistir, ia embora abandonando, sem ao menos saber se valia à pena ou não.
Quantas amizades se foram, não sobraram nem fotografias, nem cartas, bilhetes. No íntimo ficava a dúvida se conseguia ou não agradar ciclana e bertana com sua maneira de exteriorizar pensamentos, comoções e sentimentos. Sua intemperança desagradava a si mesmo, tudo era em demasia, não havia meios termos. Quanto desagrado. Não lhe convinha mais ocupar o tempo de pessoas queridas, causando-lhe desconforto.
Decidiu ir embora, pegou trapos e restos, mesmo sem porta-retratos, sem diário decidiu ir sem lembranças, tentar em outra vizinhança. Foi sem rumo pra longe, pagou à um táxi tudo o que tinha e saiu, de salto andou até a esquina, a noite estava caindo, a clientela chegando, retocou o batom cor de sangue, soltou o cabelo e saiu feito cantora de cabaré. Seu andar não enganava, ela era tão doce quanto amarga, era boa quando era boa, mas quando má, era melhor ainda. E como tudo em demasia enjoa não podia se permitir ali por muito tempo, tinha de aproveitar o cliente que ia chegando extasiado.
Ilustração de Carol Cuquetto: oamareloeonada.blogspot.com